domingo, 14 de outubro de 2012
quinta-feira, 11 de outubro de 2012
segunda-feira, 8 de outubro de 2012
quinta-feira, 4 de outubro de 2012
segunda-feira, 1 de outubro de 2012
História dos Monstros
Existe livro muito interessante, intitulado Histoire des Monstres depuis l´antiquité jusqu´a nos jours (link ruim de abrir!), de um certo Dr. Ernest Martin. A publicação, de 1880, não parece destoar de uma série de preconceitos eurocêntricos e retrospectivos (a temática da ‘descoberta’, do ‘progresso’, da ‘humanização’ do ‘monstro’, da ‘objetividade’ do ‘homem’, e assim por diante). Mas Martin reúne material muito precioso nesse livro, especialmente para quem busca compreender como surgiu noções como a de ‘normalidade’.
Além da temática histórica, o livro é bom para encontrar material sobre várias épocas. Já na Introdução, Martin menciona a ‘descoberta’ de Étienne Geoffroy Saint-Hilaire de um monstro embalsamado no antigo Egito, em 1826. O ‘monstro’ foi encontrado numa tumba de Hermópolis para ‘animais sagrados’, junto com um amuleto que representava um macaco. No fim das contas, tratava-se de um ser humano, "nascido de mulher", porém sem cérebro (um "acéfalo", conclui Martin); o tratamento do ‘monstro’ no antigo Egito carregava uma série de significados sacros, diversos dos de outros animais (papel simbólico e radicalmente diferente de tudo o que podemos imaginar!); e enfim, ‘descobria-se’ que, no mesmo movimento, para uma determinada cultura um indivíduo teria origem bestial, e ao mesmo tempo, estatuto sacro. Algo mais irredutível às nossas crenças?
Mas Martin não é Borges. Portanto, temos aqui um livro muito interessante de um autor do século XIX sobre a história da monstruosidade, recheado de referências.catatau.wordpress
No Espaço, ninguém pode ouvir você gritar
“Não é necessário crer que o Mal venha de uma fonte sobrenatural; o homem por si só é capaz de todo tipo de perversidade.”
Joseph Conrad
Apertem os cintos e chequem a bateria de suas lanternas, pois hoje embarcaremos numa viagem sombria e repulsiva até onde a lucidez da ciência se funde com a insanidade do terror!
Exploração e Medo, irmãos inseparáveis
O medo é a mais poderosa das emoções. Inclusive nos animais, o medo é uma das principais ferramentas de sobrevivência. Ao menor sinal de perigo, o corpo, movido por uma descarga neuroquímica comandada pelo cérebro, desencadeia reações para que eles possam lutar ou fugir. Eles ficam mais atentos, mais fortes, mais capazes e sua resistência à dor aumenta pois a necessidade de viver, naquele pequeno lapso de tempo, se torna a única prioridade. Foi o medo, esse sentimento tão incômodo e ruim, que fez com que os animais conseguissem viver e prosperar, cada um ao seu modo.
Lutar ou fugir? A escolha é sua.
E o que são os homens, senão animais? Animais cujas criatividade e inteligência extrapolam e surpreendem, mas animais. E animais sentem medo.
As obras de terror se aproveitam disso para imergir a plateia nessa emoção, atingindo assim seu objetivo máximo por definição: assustar. A ficção-científica, por sua vez, vive para especular. Sua própria natureza desbravadora prevê mundos e situações que ainda não existam, que sejam desconhecidos para a mente humana. E apesar de seu objetivo não ser o mesmo do terror, é impossível separar os dois gêneros totalmente – e é fácil entender quão bem eles trabalham juntos – por uma explicação banal: o desconhecido é assustador.
Entre os maiores medos que sentimos, senão o maior, está o medo do desconhecido. O desconhecido, que traduz-se numa miríade de formas, como o medo do escuro, medo da rejeição e medo da morte. O que jaz dentro do véu da escuridão? O que será de mim quando estiver sozinho? O que está além da vida? Questões que aterrorizam por um único motivo: não conhecemos suas respostas.
A Ciência ilumina. Mas a luz sempre projeta sombras
Conforme a sociedade evoluiu, os temas tratados pela ficção se adaptaram para ficarem sempre parelhos com o conhecimento humano de sua época, e aqueles tratados pelo terror também. Com a ciência iluminando o que o desconhecido obscurecia, foi se tornando cada vez mais difícil assustar o público. Se antes tínhamos medo dos habitantes marcianos de “A Guerra dos Mundos”, de 1953 (dir. Byron Haskin), hoje sabemos que Marte não possui vida inteligente. A solução para continuar causando medo com essa ideia é: não especificar de onde os alienígenas vem, como no remake “Guerra dos Mundos”, de 2005 (dir. Steven Spielberg). Não há vida inteligente em Marte, mas quem garante que não há vida inteligente em lugar algum?
Marcianos, não. Quem sabe Klingons?
Mesmo que marcianos não nos causem mais medo, ainda temos medo de um possível apocalipse zumbi, com razão, pois a hipótese de que um vírus ou algum outro agente bioquímico possa contaminar pessoas transformando-as em carniçais assassinos ainda não foi descartada pela ciência. Alguns casos bizarros que pararam nos noticiários do mundo inteiro servem para fundamentar ainda mais essa hipótese.
Os produtores e estúdios sabem disso. Se a função do filme de horror é assustar, e é mais fácil assustar com plausibilidade, poderíamos supor que o número de filmes com temática zumbi tenha crescido ao longo do tempo, certo? E ele cresceu. Muito.
Década Qtde. de filmes com temática
“zumbi” lançados
Anos 20 001
Anos 30 004
Anos 40 007
Anos 50 007
Anos 60 013
Anos 70 033
Anos 80 077
Anos 90 064
Anos 2000 331
Fonte: Wikipedia – List of Zombie Films:
O grande responsável pelo retorno do tema ao cinema foi o diretor George Romero com seu “A Noite dos Mortos-Vivos” (1968) que gerou diversas sequências como o espetacular “Despertar dos Mortos” (1978) e – além de muitos remakes – influenciaram uma geração inteira de cineastas, cujos tratados sobre mortos-vivos começaram a pipocar nos anos 90 e 2000, com um toque mais científico, como “Extermínio” (dir. Danny Boyle, 2002), e até cômico, como “Zumbilândia” (dir. Ruben Fleischer, 2009).
Em “Zumbilândia”, o que causou a infecção zumbi foi uma mutação do vírus da “doença da vaca louca”.
Terror ou Horror? Suspense ou Splatter?
Por vezes não percebemos o poder de aterrorizar que a ficção científica tem. Isso porque normalmente ela atua no domínio sutil do terror, não do domínio repelente do horror. Parece um pleonasmo, mas existem diferenças entre terror e horror que devem ser notadas se quisermos entender as tendências cinematográficas – e não só essas.
Conceitualmente falando, o terror é a apreensão que sentimos antes de algo ruim acontecer. É a câmera focando na porta, que você sabe que será aberta em breve pelo assassino (ou não será?), é a mocinha explorando o cômodo escuro e silencioso de sua antiga casa, são os barulhos causados pelo movimento da criatura dentro dos dutos de ventilação. É o que leva o espectador a roer todas as unhas de suas mãos, o que faz os casais se espremerem no escurinho do cinema, é considerado o objetivo de todos os criadores de medo, por ser uma emoção dificilmente esquecida, que se prolonga por um tempo imensurável.
A apreensão: Terror.
O horror, por sua vez, menos nobre que o terror por ser mais facilmente esquecível – e também atingível pelo criador da obra – é o sentimento incômodo que sentimos após presenciarmos algo perturbador e violento. É o assassino distribuindo machadadas encobertas pelos limites da tela, é o ser alienígena se alimentando de um ser humano, é o demônio possuindo a garotinha. É o susto que leva a plateia a pular e deixar escapar um gritinho que, em qualquer outra situação, seria vergonhoso. O horror costuma ser pontual. Depois do choque da revelação, ele perde a força.
A revelação: Horror.
O mestre do terror literário Stephen King – cujas obras já foram adaptadas para dezenas de filmes, incluindo aí os ótimos “O Iluminado” (1980) de Stanley Kubrick e “Carrie, A Estranha” (1976) de Brian De Palma, e os péssimos “O Apanhador de Sonhos” (dir. Lawrence Kasdan, 2003) e “Trucks – Comboio do Terror” (dir. Chris Thomson, 1997) – defende que o horror possui mais uma divisão além do próprio: a repulsa. A repulsa é uma sensação aguda de nojo e aversão, maior ainda que a proporcionada pelo horror. É o repugnante desmembramento de um corpo, graficamente detalhado, é o sangue jorrando na câmera, é o vômito do demônio, é a “Centopeia Humana” (dir. Tom Six, 2009) (e se você for proprietário de um estômago fraco, não clique de forma alguma neste link do trailer. Clicou? Depois não reclame que não avisei). A repulsa, mesmo sendo um subtipo de “horror”, quebra um pouco nossa suspensão de descrença, em muito pelo seu teor apelativo, então é considerada a forma mais rasa de causar medo.
O choque: Repulsa.
A seguinte frase, do próprio King, resume bem as três formas do medo: “Eu reconheço o terror como a melhor forma de emoção e, portanto, tento aterrorizar o leitor. Mas se eu vejo que não consigo aterrorizá-lo, tento horrorizá-lo, e se vejo que não consigo horrorizá-lo, parto para a nojeira. E não me orgulho disso”.
O cinema também segue essa distinção, de forma até mais explícita. Todos os filmes são compostos de uma amálgama de emoções diferentes, mas a primeira forma de se usar a classificação por gênero é sinalizar qual tipo de emoção é capital na obra. O que chamamos comumente de suspense, ou “terror psicológico”, evoca o terror, enquanto que “filmes de terror”, normalmente remetem ao horror, não ao terror. Em alguns casos, principalmente nos splatter (ou gore) films, eles se encaixam perfeitamente na definição de repulsa.
Perceba que os gêneros do medo são atrelados à emoções – assim como “Comédia” e “Romance”. Mas existe uma segunda maneira de classificação por gênero, que é a classificação por tema. Daí, surgem os gêneros “Policial”, “Faroeste” e, como não poderia deixar de ser, a “Ficção científica”.
A Origem do Mal
Na década de 30, o terror começou a se popularizar no cinema, principalmente com os estúdios Universal lançando as obras que, até hoje, são conhecidas conjuntamente como Monstros da Universal, contendo mais de 50 filmes, sobre seres fantásticos como vampiros e múmias, e seres não-tão-fantásticos – até científicos, como o monstro do Dr. “Frankenstein” (1931, dir. James Whale), baseado no livro de mesmo nome de Mary Shelley e o “Homem Invisível” (1933, também dirigido por Whale), baseado na obra homônima do gênio da sci-fi H. G. Wells (e cujas histórias você certamente conhece, dadas as centenas de remakes e readaptações desses livros ao longo dos anos). Esses últimos, por mais sobrenaturais que pareçam, tem como base a ciência de suas respectivas épocas.
Monstros da Universal
A história do monstro de Frankenstein, que foi revivido por uma descarga elétrica, originou-se cerca de 30 anos depois da descoberta científica da galvanização por Luigi Galvani, que a descrevia como “eletricidade animal” – lembre-se que a ciência do século XVII andava muito mais lentamente que hoje e que trinta anos não eram tanto. Hoje sabemos que algumas das convicções de Galvani estavam erradas e que quando passamos correntes elétricas em um órgão, não os movemos por “ressuscitar-lhes temporariamente” e não podemos reviver cadáveres simplesmente injetando-os essas correntes. Porém, na época, isso era uma hipótese científica a ser estudada.
Até mesmo monstros cujas descrições mais clássicas não são baseadas em ciência, podem ter um pano de fundo científico. É o caso do lobisomem, por exemplo. O lobisomem é, popularmente, o ser metade homem, metade lobo. Mas de forma genérica, é o ser que transmuta-se em outro, revelando e amplificando seu interior maldoso. A famosa história de “O Médico e o Monstro”, nada mais é que uma aproximação do lobisomem à realidade. A história foi adaptada às telonas múltiplas vezes, com a versão de 1931 (mesmo ano dos outros monstros acima e dirigida por Rouben Mamoulian) sendo a mais popular, inclusive garantindo um merecido Oscar de melhor ator a Fredric March, que personifica as personagens do título. O Dr. Jekyll (“Médico” do título), que quis expurgar de si sua parte maldosa, com a ajuda de uma poção, acabou por separá-la e individualizá-la. Resultou que, quando a parte má tomava controle, não havia nem um pingo de bondade nesta, tornando o pacato doutor no monstruoso e sinistro sr. Hyde – uma espécie de lobisomem provocada não pelo misticismo da lua cheia, mas pela química.
Por mais fantástico que isso pareça, convivemos com poções Jekyll/Hydeanas quase que diariamente. A psiquê de todas as pessoas, de acordo com a teoria da psicanálise de Freud, é dividida em três “subpersonalidades”. O “id”, o “ego” e o “superego”. O “id” é a parte instintiva do ser humano, sem nenhum tipo de amarra comportamental e social. É por causa dele que temos impulsos e vontades. Já sentiu raiva de alguém a ponto de querer esmurrá-la? É o “id” falando. O sr. Hyde da história, é o puro “id” encarnado, preocupado apenas em atender suas vontades, sem nenhuma consciência de ética ou moral. O “superego”, por outro lado, é a parte controladora, a parte que tem todas as noções e amarras que nos impede de fazer algo que seja “errado”. “Não soque a cara dele. Isso te fará miserável no longo prazo”. O “ego” é o agente que une o “id” e o “superego”, que busca atender as necessidades do “id”, seguindo algumas limitações do “superego” de forma que nos traga benefícios no longo prazo. O “ego” é, portanto, o que nos define. É o doutor Jekyll que, como qualquer pessoa, é um misto de “bondade” e “maldade”.
O “id” contra o “ego”.
Algumas pessoas sofrem de transtornos mentais patológicos, em menor ou maior grau. Nos piores casos, temos pessoas que cometem crimes graves e quaisquer outra sorte de insanidades, por não terem seus freios mentais (o seu “superego”) em bom estado. A medicina trata dessas pessoas com drogas que diminuem seus impulsos, como calmantes fortíssimos e até métodos físicamente mais agressivos como eletrochoques. Note que o que a medicina criou para resolver esse problema foi uma poção de dr. Jekyll em cápsulas, mas que de forma inversa à ficção, mesmo trazendo um milhão de efeitos adversos, funcionou.
No Espaço, ninguém pode ouvir você gritar
O melhor exemplo de ficção científica de terror, na opinião de muitos, incluindo deste que vos escreve, é o filme “Alien, o Oitavo Passageiro” (dir. Ridley Scott). Seu mote é “No Espaço, ninguém pode ouvir você gritar”. O clima sombrio do filme, capturado pelo diretor de fotografia Derek Vanlint, só faz aumentar o terror da plateia que, a cada instante, se imagina no lugar da tenente Ripley (Sigourney Weaver), inteligentemente situada como centro da ação somente desde o meio do filme, piorando a sensação de solidão recordada pela tagline. Ficção científica no seu primor, dada a plausibilidade do cenário – mesmo que futurista – e terror de qualidade, visto que o xenomorfo não precisa de muito tempo em tela para acovardar o mais machão dos espectadores, e a violência gráfica, apesar de presente, não é o foco. O filme, de 1979, é o brilhante resultado de um longo aprendizado que começou com os monstros arquetípicos da Universal, quase 50 anos antes.
Terror: o que há por trás desses malditos corredores?
Podemos citar também “O Enigma de Outro Mundo”, lançado por John Carpenter em 1982, como outro ótimo exemplo. A própria ambientação do filme, apesar de terrestre, é em um lugar isolado e sombrio – o ártico. Para tornar as coisas ainda mais desesperadoras, este monstro alienígena toma a forma de qualquer ser vivo que ele mate, podendo assumir inclusive a forma do seu melhor amigo. Imagine confiar totalmente em alguém que, na última hora, se revela o seu algoz? Muito pior que o “desconhecido”, é quando perdemos a noção do que temos por “certamente conhecido”.
Algum dia isso já foi identificável.
Para finalizar, deixo também uma recomendação que, de tão surreal, chega a ser quase inclassificável. Em “Cubo” (dir. Vincenzo Natali, 1997), somos apresentados a uma situação de paranoia e desespero que nos remete aos pesadelos mais insanos que já participamos, em uma noite mal-dormida. Assim como um sonho, o filme não se justifica, não apresenta uma lógica linear, não se preocupa em esclarecer nada. Mesmo assim, é aterrorizante e assustadoramente plausível. Terror e agonia, num cenário que poderia acontecer com qualquer um, num dia de (muito) azar.
Torça para nunca acordar dentro do Cubo. Nunca.
Então, quando você estiver no cinema e os créditos de um filme de terror estiverem rolando, relaxe, respire fundo e fique tranquilo. Foi só um filme, uma obra de entretenimento, de ficção.
Mas, se essa ficção for científica, tome muito, muito cuidado. O terror ainda não acabou.cinesplendor
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